Na minha curta estad
ia no Recôncavo Baiano visitei várias cidades com a Regina e o Laécio. Foi tudo bom: a companhia, as acomodações,
Folia de Santo, as comidas, os passeios. Foi tão bom que eles me fizeram cogitar morar na Bahia, coisa que meu pai sempre quis e nunca conseguiu. Numa dessas viagens, passamos por Santo Amaro, cidade de Caetano e Bethânia. Lá almoçamos muito bem enquanto observávamos uma figura misteriosa fumava na porta do estabelecimento, que claramente era importante na cidade. Uns jovens qu
iseram sentar perto e com um simples gesto de dedos ele os expulsou dali. “Deve ser parente de Caê”. Só de estar em solo sagrado já estávamos assim, íntimos da família de Dona Canô.
Aí fomos para a princ
ipal rua da cidade e não foi difícil achar a casa de Dona Canô. Pela foto, dá pra perceber que a cidade é muito limpa e ainda não tinha tirado os enfeites das festas juninas. Nenhuma dessas casas é a casa de Dona Canô, mas era do mesmo estilo. Caso alguém ficasse na dúvida, bem na frente tinha placas, uma falando de Bethân
ia e outra de Caetano.
“Essa não é a casa de Dona Canô”, falou Regina, que nessa época nem tinha assumido que é
Viciada em Problematizar – “Eu v
i uma entrevista recente dela, em casa, e ela está num jardim grande. Essa casa é pequena”. Ficamos com vontade de conferir. A casa estava linda e bem cuidada, e quase fomos entrando, naquele raciocínio de que deve ter se transformado num museu. Só depo
is percebemos que não era, tinha alguém morando lá. Provavelmente um primo de Caê.
“Eu acho que essa é a casa onde eles passaram a infância. Depois os dois fizeram sucesso, ficaram ricos e compraram outra casa para a mãe, aquela que eu vi na entrevista”. Aí decidimos procurar a outra casa, a boa, a ú
ltima morada de Dona Canô. Fomos andando pela rua. Em quase todas as casas havia pessoas de idade com cadeiras na varanda tomando uma cervejinha. Abordávamos todas: “Você sabe nos dizer onde fica a última casa de Dona Canô?”. Quase todos nos descrev
iam aquela casinha que havíamos acabado de ver. Agradecíamos e íamos embora, claramente gente desatualizada. Até que uma senhora, que tomava cerveja sozinha na sua varanda, nos informou: “Vocês querem a última casa da Dona Canô? Eu não sei o número, fica na rua aqui atrás. É só vocês pegarem essa rua e logo vocês vão ver”.
Viramos a esquina e era uma ba
ita subida. Fomos de carro. À medida que subíamos, as casas iam ficando mais feias, uma favela. “Não vai ser difícil achar a casa de Dona Canô porque ela vai ser a mais bonita, vai se destacar no meio dessas casas pobrinhas”. Subimos, subimos, subimos. Perguntamos sobre a casa de Dona Canô e todo mundo nos indicava aquela que havíamos acabado de conhecer. Era subida que não acabava mais e nada de achar uma casa bonita. “Regina, se abraça com uma velhinha dessas e diz que não encontrou com Dona Canô mas conheceu uma amiga de infância dela. Provavelmente é verdade”. Mas ela não quis me ouvir. Até que chegou um ponto que vimos que velhinha nenhuma conseguiria subir tanto, que Caê não faria aquilo com a própria mãe. Desistimos e decidimos conhecer outra cidade.
Na descida, v
iramos a esquina na rua paralela ao nosso ponto de partida. Olhei à minha direita e “gente, olha lá, foi isso o que a mulher quis nos dizer!”. Logo ali atrás estava a ú
ltima morada de Dona Canô: o cemitério.