Eu contei essa história pra minha professora de costura e ela riu e disse que assim eu a matava de vergonha. “Viu o que as tuas aulas estão fazendo comigo?”
Estava muito frio e eu estava sentada na parte de trás daqueles Inter 2 sanfona. Já estava escuro, num horário que ainda estaria claro que estivéssemos no verão. De pé, ao meu lado, parou uma moça. Eu olhei para cima e vi que ela vestia um tipo de casaco que não sei definir, não sei se tem nome, mas que eu acho um charme: é como uma manta, fechada no pescoço e que cai sem mangas. Muito curto pra ser um poncho, mas é o mesmo princípio. Esse casaco que ela usava balançava levemente a cada movimento do ônibus. A cor era predominantemente marrom, com salpicos de preto e bege, o que lhe dava um aspecto meio animal. Era peludinho por fora. Por dentro, dava para ver as mesmas cores, só que sem os pelos, o que mostrava que aquele tecido, ou seja lá o que era, não tinha forro.
O que seria? Tinha todo aspecto de ser uma pele, de muito boa qualidade dada a leveza, mas pele precisa de forro. Descobri isso porque uma moça que faz aula comigo viu uma polaina de pele por quase cinquenta reais e comprou, pra tirar cópia e revender. Só que quando foi fazer as polainas descobriu que pele é caríssimo (custou uns 70 reais o metro) e difícil de costurar. Cada vez que você manuseia ela se desfaz um pouco, precisa colocar forro, a linha se perde lá dentro, um saco. A curta experiência fez com que ela – e todos nós que acompanhados o drama – percebesse que a polaina não estava tão cara quanto pareceu à princípio.
Eu passei quase toda viagem olhando para o casaco da moça, bem ao meu lado, tentando adivinhar o que era. Seria lã? Isso explicaria a leveza e a ausência de forro, mas seria uma lã bem incomum, para fazer aqueles pelinhos por fora. E a cor tinha todo aspecto de pele. Pele ou lã, pele ou lã, pele ou lã? Aí finalmente eu tinha que descer e me levantei. Eu fiquei ao lado da moça. Sem que ela percebesse, eu baixei a mão esquerda e pus discretamente sob o seu casaco e apalpei.
Lã.
Mistério resolvido.