Semente da dúvida

A pequena Claudia não tinha nem dez anos quando disse ao seu pediatra:
– Quando eu crescer, vou ser médica que cuida crianças igual você.

Claudinha cresceu, tentou vestibular para medicina quatro vezes até passar, se especializou em pediatria. Foi trabalhar como assistente do seu próprio pediatra. Quando ele decidiu se aposentar, passou todos os seus clientes para ela.

Essa história é verdadeira. E é das coisas mais anti-eu que eu conheço.

A sopa e 2013

Eu tenho fases de me aproximar mais da cozinha e tentar pegar gosto pela coisa. Tenho até uma boa biblioteca sobre o tema. Uma das receitas que fiz várias vezes foi a sopa que reproduzo a seguir. Eu a escolhi porque procurava algo simples e rápido. Sopas, pela própria constituição delas, são coisas bem preguiçosas de comer. Lá vai a receita:

Sopa do sol nascente

Corte 3 cebolas em gomos e refogue; junte 250 gramas de cogumelos e 250 gramas de camarões miúdos. Por último, ponha duas xícaras de repolho cortados em quadradinhos. Tempere com 3 colheres de molho de soja, deixe cozinhar alguns minutos e apague. 
Cozinhe 200 gramas de macarrão de trigo sarraceno (soba, tipo japonês) em um litro de água com colherinha de sal marinho e outra de óleo. Quando o macarrão estiver quase no ponto junte o refogado e deixe cozinhar mais 3 minutos. Sirva com cheiro verde picadinho por cima.
Prato Feito, de Sonia Hirsch (p. 72)

Parece a coisa mais rápida do mundo, né? Eu achava a quantidade de camarão pequena (os bandidos quase somem quando a gente limpa) e punha de uma vez meio quilo. O macarrão eu comprava lá no Mercado Municipal. O problema é que entre picar as coisas, limpar os camarões, refogar numa panela e esquentar água na outra, eu levava um tempão. E ficar um tempão era justamente o que eu não queria. Eu queria uma receita simples e rápida. No caso desta, ela é realmente é simples e rápida, nos finalmentes. O que demora é a preparação.

(No fim, nem foi pela questão do tempo que eu parei de fazer a sopa. Ela é muito boa para ser consumida na hora, mas péssima para guardar. O soba absorve muita água e fica aquele monte de massa)

O meu ano de 2013 foi esse período de cozinha, de preparação. Anozinho chato, viu. Passou (está ainda) arrastando. Se fosse um romance, esse ano seria a barriga. Ou seria aquele período que o autor pula, em que ele diz: um ano depois… Porque se for pra contar pra vocês o que aconteceu, fazer listas, apontar resultados, não tenho nada. Nada que ainda possa ser exibido à luz do dia. Está tudo gestado, decidido, pesado. Eu, que sou do tipo que entre esperar no ponto de ônibus e ir a pé, sempre acaba indo a pé por gostar de se sentir senhora da situação, sofri com isso. Esperar sempre foi contra a minha natureza e cá estou, quietinha. Quietinha por saber que é inevitável, saber que é a coisa certa neste momento. Alguma coisa a gente tem que aprender depois de tomar tanta porrada na vida.

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Eu estava sem saber o que escrever para este post, bloqueada. Aí li a newsletter do Alessandro (recomendo fortemente!), pensei em como seria fazer uma, e várias ideias já surgiram. Quem sabe eu entre nessa. Se entrar, eu aviso aqui.

Curtas queridas

Antes eu pensava que precisava gostar de rock pra me aproximar de quem gosta de rock, entender de carros com quem gosta de carros ou de cinema para com os cinéfilos. Não é assim que funciona. Há poucos dias vi uma abordagem dessas, onde um grande apreciador de flamenco se aproximou de pessoas que estão num nível alto de flamenco, e chegou conversando loucamente sobre flamenco. Veredicto: que mala! Esses fanáticos são muito malas. Hoje faço justamente o contrário: não falo do que a pessoa é especialista. Já pensou que chata que deve ser a vida do professor Pasquale, com todo mundo querendo discutir regras gramaticais com ele? Ou do Rubens Edwald Filho, com todo mundo querendo discutir cinema? Especialistas, apesar de especialistas, gostam de outras coisas também. Mais: falar com eles sobre o que eles sabem é pedir pra falar besteira.
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De vez em quando a vida nos dá o privilégio de assistir aos conflitos alheios como quem assiste uma novela. Quando a gente conhece todos os envolvidos é muito difícil atribuir razões e erros. Um lado está insatisfeito porque existe uma ordem, uma hierarquia, que diz que as pessoas que estão há mais tempo merecem mais consideração. Mas existe também o outro lado, que já foi prudente um dia e esperou que seu talento fosse reconhecido; não foi, então pra não ser vítima de novo desta vez resolveu fazer diferente e cobrar seus direitos. Conseguiu, mas desagradou a todos. Numa situação, foi a vítima, cheia do carinho e solidariedade que se tem com os que são jogados para escanteio; na situação atual, é a pessoa mais odiada, que passou por cima de todos e foi colocada num lugar acima. O que eu tenho a dizer, vendo de longe, que ser vítima é ruim, ser vilão também é ruim. O ideal mesmo seria

 

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Dias desses a Regina disse que se sentia enganando as pessoas que viam nela uma pessoa calma. Eu me sinto enganando um monte de gente de direita, branca, bem nascida, convencional, destatuada e hetero que me tem carinho porque vê em mim uma delas. Não que eu não tenha quase todas essas características por fora. Só que, diferente dessas pessoas, eu não acho que tais coisas me definem, não procuro me relacionar apenas com quem as tenha, entende? Quem me conhece sabe, quem lê os sinais sabe que meu coração vibra diferente. Meu coração recita o Cântico Negro.

O fim está próximo

Não lido bem com as últimas semanas do ano. Sempre fui assim. Na época que eu era muito, mas muito ocupada, era um choque pra mim de uma hora pra outra não ter nada para fazer. No primeiro dia é legal, no segundo também, mas depois eu sentia falta da adrenalina, do passar o dia inteiro fora de casa, da atividade. Agora não sou tão ocupada assim e as minhas poucas ocupações se tornaram ainda mais caras. No final do ano tudo e todos entram em férias, viajam, deixam de acessar a internet e fico completamente à toa. Quase enlouqueço de tédio. Não é à toa que eu criei o meu twitter no natal. Batata que nos próximos dias vou mudar o layout do blog, acessar mais o tumblr… quem sabe eu até crie em alguma outra plataforma.

 

Falando em fim, a declaração do Alessandro de que vai parar de blogar tem mexido comigo. Concordo com tudo o que ele disse sobre o passado e o presente das postagens. Acho que realmente já deu. Este meu blog mesmo já deu faz tempo, não sei nem porque vocês vêm aqui ainda… Só que eu ainda não achei a minha solução.

Expressão

Entre uma coreografia e outra, no Tablao de sábado passado, eu ficava assistindo os outros do fundo da sala, pra não atrapalhar. Lá, perto de mim, estava uma iniciante que dançou sevillanas, com o namorado. Os dois ficavam conversando, se perguntando quem era professor e quem não era e tal. Quando umas meninas estavam dançando lindamente uma coreografia difícil, a moça disse algo como “estou vendo como é que eu vou ficar daqui há alguns anos”. Lembrei de uma pergunta que eu fiz e vi outros fazerem várias vezes – a gente encontra alguém que dança bem e pergunta há quantos anos a pessoa dança. Aí a gente faz o cálculo – “se eu tenho um ano de flamenco e ele seis, então daqui há cinco anos estarei assim”. Hoje sei que é um pensamento bastante iniciante.

 

Pra alguns dá vontade de responder que nunca vão dançar daquele jeito! Mesmo porque a gente gosta, é claro, de se espelhar naqueles que dançam excepcionalmente bem. Existe um problema na curva aprendizagem, e acho que isso acontece com tudo, de que ela pode parar a qualquer momento. Claro, existe o básico, aquilo que com insistência e bons professores, todo mundo pega. Mas nem todo mundo chega a fazer as coisas mais difíceis, assim como nem todo mundo que escreve vira escritor ou todo mundo que faz curso de línguas sai falando igual nativo. E tem a parte da beleza, da expressão, que aí é mais impalpável ainda.

 

Olha, a cada dia que passa, parece que gosto menos de mim dançando, expressivamente falando. Estou fazendo coreografias mais difíceis e uns sapateados que há um ano atrás nem acreditaria que conseguisse. Mas tenho a consciência mais aguda de que o que realmente importa, aquela expressão artística única, não dá pra controlar, não dá pra garantir. Nisso, posso dar uma lista de pessoas que eu gosto mais. O que dá pra trabalhar é a técnica. Dá pra fazer o esforço, decorar a coreografia, contar os tempos, ouvir os conselhos. O nosso trabalho acaba aí. A beleza que puxa o olhar, que faz a gente não conseguir desviar os olhos daquele bailaor e não de outro, é de cada um. Alguns são mais belos e outros menos, e acabou.

Dukan – um ano depois

As datas não são exatamente as mesmas, mas a apresentação de flamenco me faz lembrar que nessa época eu estava no começo da Dieta Dukan. Várias amigas minhas estavam fazendo e eu comecei a dieta impulsivamente no fim de novembro, sem me dar conta que isso faria com que eu estivesse em dieta em pleno natal e ano novo. A dukan combinou muito comigo porque é uma dieta rigorosa, e eu quando escasqueto com uma coisa vou até o fim. Os resultados são rápidos, mas você não pode se desviar do cardápio de jeito nenhum. No dia da apresentação, marcaram ensaio geral, que se estendeu para além da hora do almoço. Todos assaltando as muitas bolachas e besteiras que tinha na escola e eu me segurando,  porque naquele dia eu estava em PP (proteína pura), ou seja, teria que comer apenas alimentos do grupo da proteína. Lembro e até eu me impressiono. Cheguei no buffet aqui perto de casa por volta das 15h, tonta de tão faminta e comi em poucos minutos três grandes pedaços de salmão. À noite, durante a festinha, levei uma tábua de frios e fiquei só no queijo… O próprio site da dukan havia liberado as pessoa para o que eles chamaram de fase PJ – pé na jaca. Mas eu não quis. Depois de tanto esforço, ia ficar tão aborrecida de demorar mais algumas semanas que preferia manter a dieta em pleno natal e ano novo. Não comi um único panetone, nada, nem um docinho.

 

No dia da apresentação o meu manequim já havia mudado e eu me sentia, pela primeira vez, bonita dentro do figurino de flamenco. Entrei para a fase de manutenção no final de fevereiro. Ao todo, eu emagreci nove quilos. No momento em que escrevo isso, tenho lutado contra um quilo que adquiri nas últimas semanas, com o fim do inverno e as muitas confraternizações de fim de ano. As amigas que me recomendaram a dieta, infelizmente, recuperaram mais peso. Todas foram unânimes em dizer que tenho uma vantagem muito grande na manutenção do peso por não beber álcool. A dukan mudou meu modo de comer no dia a dia, estou sempre de olho nos grupos de alimentos. Meu cardápio básico é o da fase de consolidação, só que com menos rigor. Mantenho o hábito do dia de PP uma vez que por semana que, admito, é sempre um dia mais longo do que os outros…

 

Agora existem várias outras facilidades que não tinha quando eu fiz a dieta, mais livros de receitas, produtos dukan. Nunca quis narrar minha experiência no blog porque não queria que as pessoas me consultassem a respeito da dieta, como fazem com os blogs que contam as experiências pessoais. Acho que pra quem quer seguir o caminho é mesmo comprar o livro e/ou se inscrever no site. E fazer à sério, sem escapadinhas. Comigo deu certo, é isso o que eu posso dizer.

Os que precisam

o me meto em brigas virtuais e nem reais porque me canso antes mesmo de. O que aconteceu há alguns dias é um exemplo.
Estavam discutindo o quanto agora pagamos mais para receber um atendimento pior. Que mesmo indo a lugares mais caros, o atendimento deixa a desejar. Tudo culpa dos serviçais, que não são mais como antes. Por qualquer dinheiro a mais, eles já trocam de emprego e jogam no lixo o treinamento que receberam. Pra quem tem loja em shopping é uma dificuldade. Se o local exige que eles façam plantões, que trabalhem sábados, domingos ou à noite, já não querem. Os empregados aceitam esses empregos temporariamente, com vistas de conseguir outros que não lhes comprometam os fins de semana. Quem manda oferecer a essas pessoas opções. É essa maldita política social, é culpa do Bolsa Família. Eu ouvia tudo em silêncio. Tentei uma brecha ao dizer:
– Eu também, se pudesse escolher, não gostaria de um emprego que me exigisse trabalhar no fim de semana.
Ah, mas é diferente! Ninguém ali gostaria, mas é diferente. Somos pessoas diferentes. Aquela conversa era sobre eles, os que precisam, os que devem aceitar qualquer coisa pra não morrer de fome. Eu ouço essas coisas e me sinto um alien. Ou melhor, eu é que não sou um alien. Eu me vejo como igual às outras pessoas, os que querem lazer, os que querem salários melhores, os que buscam o que lhes parece mais favorável. Já uma parte mais privilegiada da sociedade se vê como se de substância diferente. Eles são os que devem ser bem servidos, sob qualquer circunstância.

Só um ano?

É engraçado como olhar vídeos e fotografias pode nos fazer recordar exatamente o que sentíamos na época que foram registrados. Eu sabia que nos próximos dias dançaria era o meu segundo tablao de natal, ou seja, estou nessa escola de flamenco há pouco mais de um ano. Mas apenas ontem, olhando as imagens do ensaio do ano passado, eu me dei conta do quanto os meus sentimentos mudaram nesse ano. Eu lembro daqueles ensaios, de estranhar todo aquele clima de confraternização – não era ali que haviam me falado tão mal, me dito que as pessoas eram frias e que ninguém me daria bola? Fui tão bem acolhida, me diverti tanto. Eu não sabia o nome de ninguém e passava aqui e ali, tentando não atrapalhar, tentando encontrar meu espaço. E quanto espaço encontrei! Fiz amigos, me diverti mais ainda, progredi tão rápido! Agora sei o nome de cada um, aprendi a gostar e conhecer tanto aquelas pessoas. Não estou nem um pouco deslocada, muito pelo contrário. Que venga la noche buena!

Colonoscopia

Só com o tempo eu percebi que vivi num lar totalmente preocupado com a saúde, onde qualquer distúrbio gerava uma visita imediata ao médico. Coincidência ou não, minha mãe é virginiana, daquelas que gosta de visitar a farmácia pra conferir as novidades. Então bastaram algumas idas ao banheiro com sangue nas fezes pra eu ir parar num médico especialista, e ter a santidade do meu intestino grosso violada.

 

Antes, deixa eu voltar à notícia: abri meu facebook e fui surpreendida com um link que dizia que a idade pra fazer exame de próstata subiu dos quarenta para os cinquenta. Sempre respondi ao chororô masculino relativo a esse exame que é bem feito pra eles, é um mal necessário. Assim que a mulher começa a ter vida sexual, é punida com a necessidade de fazer papanicolau todos os anos. Um dedinho uma vez por ano depois de maduro não tem nada demais. Nada mesmo, não tem nem espéculo. Apesar da minha posição xiita, imaginei a raiva que eu sentiria, aos cinquenta anos, se tivesse me submetido a dez anos de dedadas agora consideradas inúteis.

 

Lembro bem do meu exame. Tive que usar uma espécie laxante no dia anterior e a recomendação que me deram foi de já aplicar o remédio no banheiro, do lado da privada, pronta. A embalagem disse que poderia levar um minuto pra fazer efeito, mas se leva quinze segundos já é muito. A pontada e a vontade de correr pro banheiro é tão forte que chega a ser filosófico: em poucos momentos da minha vida, me senti tão primata como naqueles momentos. Quando a natureza comanda, de nada adiantam anos de socialização e cultura.

 

Fui tranquila para o exame, numa clínica que ficava no Batel. Ao contrário do que eu pensava, não me deixaram esperar, aparentemente eu era a única a fazer colonoscopia aquela manhã. Entrei na sala grande com uma maca no meio, e o médico e a enfermeira interromperam suas leituras para me atender. Olharam para mim como quem sente falta de algo e perguntaram:

– Cadê seu acompanhante?
– Acompanhante? Eu não sabia que precisava de acompanhante.

– É que a gente dá uma anestesia e a pessoa fica meio grogue. Mas dá pra fazer sem anestesia também.

– Olha, eu vou ligar pra minha mãe agora e em uma meia hora ela está aí, que tal?
– Não, vamos fazer sem mesmo.

Sou muito boa com dores de excesso de exercício, com alongamento, com câimbras e afins. Injeção, desde que não veja a agulha. Por outro lado, sou a pessoa mais fresca que existe com as outras dores. Então confiem quando lhes digo: realmente não dói. Não dói nada fisicamente, só dá pra sentir a barriga inchando e algo andando dentro de você. Mas dói moralmente, dói de vergonha. É humilhante num grau ficar de lado enquanto enfiam um tubo em você, que a anestesia é só pra disfarçar isso. Eles enfiam aquele tubo até o limite e depois vão puxando, enquanto o médico olha pela outra extremidade. Lembro do japonês – o médico era japonês – piscando um olho e vendo minhas entranhas com outro.

– Você tem um intestino bem limpinho, quer dar uma olhada?
NÃO!

Eles riram. No fim eu não tinha nada demais, só devia comer mais fibras. Voltei para casa peidando sem cheiro loucamente e com mais empatia ao sofrimento humano.

 (o video diz que é exame de próstata mas é colonoscopia)

Rita Lee

Gostar de fazer as aulas teóricas pra aprender a dirigir ninguém gosta. As aulas se dividem basicamente em: obviedades, quando ouvimos coisas do tipo “não pode passar com o carro pro cima dos pedestres”, ou coisas pé no saco, sendo que impossível de decorar tudo- “que tipo de infração é entrar na contramão numa via de mão dupla e qual sua punição?”. Euzinha tenho ainda um problema com a auto escola por causa do horário. Não tem nenhuma perto de casa e a mais perto era muito porcaria, então estou fazendo aula meio longe. Não dá pra atrasar porque a entrada é pela digital e entra direto no sistema do DETRAN. A coisa mais comum é eu quase surtar no ônibus, sair correndo pela rua e chegar esbaforida na escola. Semanas com a bunda na cadeira, conteúdo chato, calor, intervalo pra lanche… acaba sendo impossível a gente não acabar se conhecendo mais.

Já me cobraram mais de uma vez aparentar uma certa antipatia aqui ou ser difícil de se aproximar de mim pessoalmente. De um lado, é que eu sou tímida mesmo, mas de outro também é de caso pensado. Eu gosto de tratar as pessoas bem, me sinto impelida a ser simpática, mesmo quando estou cansada. Ou seja, acabo falando e sendo legal mesmo quando preferia estar na minha. Como isso enche um pouco o saco, eu tento atrasar o máximo esse momento. Quando a gente chega num lugar e não conversa com as pessoas, pode fazer as suas coisas, pensar na vida, ler um livro… Quando as pessoas descobrem que você é legal, o laço faz com que surja a conversa, a intimidade, a necessidade de dar atenção. Então eu atraso esse momento, porque eu sei que ele nunca mais volta.

Voltando: auto escola, penúltimo dia de aula teórica. Estava lá esperando o computador funfar pra colocar minha digital e ir embora. Enquanto isso, arrumo a bolsa, pego óculos, dinheiro do ônibus, adianto o serviço. Meu instrutor surge e me chama de Rita Lee. A dona da escola me olha e diz a mesma coisa. Aí os dois começam a falar da minha roupa. Me olho e me dou conta de que estou com um óculos escuro vermelho pendurado na camiseta. Digo a eles que é paraguaio. Ninguém acredita muito e eu digo que é sim, que custou dezão. Aí eles me dizem que também adoram o Paraguai.

Enfim, a antipatia já foi pro espaço faz tempo.

Cansada

Cansada nível “não aguento esperar O Aprendiz”. Tenho perdido O Aprendiz, o único programa que eu realmente gosto e espero na TV aberta. Avaliem.

Mas está quase no fim. Amanhã é o último dia de aulas teóricas. Depois, volto a ser adoravelmente desocupada e posso me dedicar melhor aos textos. Isso sem falar que dezembro é aquela coisa: excesso de festas, despedidas, compromissos e encontros na primeira quinzena, seguidos de tédio mortal e suicidógeno no finalzinho. Aí vai dar vontade de publicar uns dois textos por dia. E não terei ninguém pra ler…

Tchau!

Schadenfreude

Se você procura um confidente, siga essa regra: você precisa de um pecador. Ou de um ex-pecador. Somente quem já errou é capaz de entender e ser solidário com quem também errou. Somente quem já fracassou pode entender um fracassado. É um alívio, comparável a estar descalço em casa, conversar com quem já fez, já aprontou, já fudeu e foi fudido pela vida. Quem nunca nada disso pode responder educadamente, pode até tentar apoiar e ser tolerante, mas no fundo você sente que ele não entende. Que essa fraqueza o tornará menor diante dele. Porque ele não, ele jamais faria uma coisa daquelas. Tenho uma teoria pessoal que diz que a única graça de ser uma pessoa moralmente ilibada é justamente essa, a de olhar para a fraqueza alheia e se sentir superior.

Palavras de Alessandro Martins:

Funciona assim: se ele que faz as coisas diferentes não se foder no final, significa que eu – que fiz tudo de acordo com a cartilha – passei a vida inteira seguindo as regras à toa. Por isso, o povo fica feliz quando os diferentes se ferram, tem uma morte prematura, são presos ou cometem algum deslize. Diferentes se ferrando são uma das maiores fontes de Schadenfreude.

Schadenfreude. Como diz a citação no link acima, é terrível e significativo que exista uma palavra assim. 

UPDATE: Tem musiquinha! Olha só que simpática… (obrigada, Luke!)

Ela é o diabo

Vi esse filme várias vezes na sessão da tarde. Nunca achei que o título do filme fosse merecido, porque a gente dá toda razão à protagonista. A história é a seguinte (atenção, SPOILERS): uma mulher comum é trocada por uma escritora bonita, rica e famosa. A marido a humilha antes de ir embora e lista as coisas que são mais importantes na vida dele. Ela anota o que ele disse e resolve destruir aqueles itens um a um. No meio dessa trajetória, a ex-esposa vai trabalhar num asilo e faz amizade com uma enfermeira implicante e solitária. Em pouco tempo, as duas se tornam amigas. Agora o que eu mais gosto do filme: quando a mulher sai do asilo, a enfermeira pede para ir junto. Ela lhe diz que tem uma imensa poupança e que não tem o que fazer com o dinheiro. Então, elas abrem uma agência de emprego para mulheres. Lá, recolocam no mercado donas-de-casa, que têm uma vasta experiência não reconhecida: são contadoras, administradoras, organizadoras e muitas outras funções, só que exercidas privadamente. Isso não é muito bacana? Conheço muita gente com esse perfil e adoraria empregá-las, se tivesse aonde.