O programa Acumuladores, do Discovery Home & Health (canal 55 da Net) é chocante e fascinante. Saber que é sobre pessoas que levam coisas demais para as suas casas não explica exatamente o que elas fazem. É uma quantidade de coisas muito maior do que o imaginavel, do que o aceitavel, e é difícil não sentir raiva ou nojo assistindo o programa. Ao mesmo tempo, nós nos identificamos com eles. Porque são gostos comuns levados ao extremo: tendência a guardar objetos bonitos, coisas que trazem lembranças ou que parece que serão úteis um dia; amor às promoções que estimula a levar coisas inúteis para casa; alguns têm muitos projetos pessoais, hobbies nunca concluídos, grandes planos sobre um dia que nunca chega. O resultado é:
Ver o programa me fez limpar a casa de uma maneira profunda como nunca tinha feito. E eu nem tinha tanta coisa assim. Ver o programa regularmente, seus exemplos chocantes, os vários tipos de acumuladores, me levou a aprender algumas coisas:
- Menos é mais
A própria chamada do programa diz: “eles acham que são donos das suas as coisas, mas são as coisas que são donas deles”. Quando um Acumulador enfrenta a idéia de alguém tirar algo de sua casa, por mais simples e barato que seja, enfrenta uma grande angústia. Dá até raiva ver uma pessoa que afastou de si família e amigos, que mal consegue andar pela casa, que vive no meio de um depósito de lixo, e se recusa a abrir mão de uma revista velha, uma caneta.
Quanto menos coisas nós temos, são menos coisas que nos fazem falta, da qual precisaremos cuidar ou que nos farão sofrer. Livre é aquele que tem pouco e que pode substituir facilmente o que tem. Penso num andarilho, alguém que tem tudo o que precisa numa mochila. Ter pouco dá mais liberdade e mais mobilidade. A definição de quem você é não precisa estar fora, no que você tem.
- Quando mais cedo você assumir o prejuízo, menor ele vai ser
Os Acumuladores costumam ter muitos projetos abandonados. Guardam móveis velhos, porque com uma camada de verniz ficariam novos; têm pilhas de lãs, porque tricotaram uma época e pode ser que um dia retomem; livros de receitas para o dia em que decidirem ter uma vida mais saudável, etc. Só que essas coisas ficam encostadas durantes anos, prejudicam suas vidas por ocupar espaço e por lembrar que aquilo ainda não foi feito.
Logo na primeira semana que vi o programa, me dei conta de que tinha nada menos do que um saco de gesso de 40kg há anos na minha área de serviço. Da época quando eu esculpia. Eu fui parando, meio sem querer parar e com a esperança de voltar. Por ser incapaz de dizer a mim mesma que não iria mais esculpir, aquele saco estava lá fora, sujando e ocupando espaço. Quando somos capazes de assumir que algo acabou, nos tornamos capazes de seguir adiante.
- Deixe o passado para trás
Teve um caso de uma Acumuladora que vivia na casa que pertenceu à sua mãe, e várias coisas que estavam lá eram de parentes que já haviam morrido. Ou muitos casos de mães que faziam questão de guardar todos os brinquedos e roupinhas dos seus filhos. Ou pessoas que se tornaram Acumuladores após uma perda e jamais jogaram as coisas do ente querido fora. Elas tinham medo de jogar fora um objeto e a lembrança ligada a ele se perder.
Ainda tenho lutado para me livrar de um passado ancestral: os objetos chineses da minha família. Por mais bonitos que eles sejam, eles estão há três gerações se impondo sobre nós, ocupando espaços, determinando a maneira como devemos decorar as nossas casas. Guardar o passado impede colocar o presente dentro de casa. O espaço que temos na nossa casa – e na nossa vida – não é ilimitado. Dar valor demais ao passado é a mesma coisa que determinar que os outros digam o que é importante pra você.
- Promoções, oportunidades e coisas belas sempre existirão
Alguns Acumuladores adoram brechós, outros compram antiguidades, quase todos não resistem às promoções e tem até quem vasculhe o lixo dos outros, em busca de coisas boas que foram jogadas fora. E sempre existe algo imperdível pelo caminho, que causa muito prazer ao ser adquirido. Mas ao chegar em casa…
Desde que comecei a ver esse programa e a limpar a minha casa, minha vontade de comprar diminuiu bastante. Porque tem sido uma luta tão grande jogar coisas fora, que antes de comprar me pergunto se ela não será mais um transtorno no fututo. Como vocês podem imaginar, minhas finanças têm agradecido. Nem tudo que é ótimo, lindo e útil precisa ser meu. Não será um bom negócio se for algo inútil. Hoje, contento-me em saber que as coisas existem, sem querer trazer pra dentro de casa.
- Nada é valioso quando em excesso/ resolver o problema é lucro
Enquanto alguns Acumuladores têm a casa cheia de lixo, muitos deles exageraram em compras de coisas de valor. Roupas de marca ainda com etiquetas, jóias, objetos de arte. Mas mesmo no menor objeto, alguns deles se queixam de que investiram dinheiro e por isso não podem simplesmente jogar fora. Eles não se conformam com a idéia de terem gastado tanto dinheiro, de ter coisas tão valiosas e não terem o retorno correspondente.
Eu tinha essa atitude com as minhas esculturas e com os objetos chineses. Em comum, são coisas que eu acho que têm valor. O meu trabalho por ser bonito e os objetos chineses por serem raros. O problema é que nunca encontrei quem pagasse o que eles valem. E por não querer ter prejuízo, por não querer ser passada para trás, guardei tudo aqui em casa. Com o programa eu descobri que dentro de casa, cobertas e jogadas, essas coisas eram apenas bagunça. Ao invés de esperar um lucro que nunca chegará, o melhor é abrir mão e me libertar dessa obrigação.
- Nenhuma decisão é pequena demais
Logo no início da terapia, é comum pedirem aos Acumuladores tomarem as decisões mais fáceis. Pegam papéis antigos, embalagens plásticas em número repetido, folhas secas no chão ou o que para nós é claramente lixo, e perguntam se eles podem jogar fora. Por incrível que pareça, alguns hesitam. Pedem para olhar tudo pra se certificar de que realmente não fará falta. Já com aqueles que se livram facilmente, a raiva é outra – Então por que não fez isso antes?
Quem não protela algumas decisões? Estou procurando ser racional e decidir logo algumas coisas que eu sabia que não ia guardar, mas de certa forma tinha pudor em jogar fora imediatamente: convites bonitos de eventos que já passaram, revistas promocionais, caixas e embalagens de presentes, objetos de decoração que não combinam com nada, roupas que comprei errado ou que por algum motivo eu não me sinto bem usando, etc. Porque se é difícil decidir isoladamente, vai ficar mais difícil ainda decidir isso no meio de uma pilha de coisas. Me poupa trabalho e uma futura bagunça. Também é uma forma de dizer a mim mesma que eu só mereço o melhor.