Arrelia (também serve Tiririca)

Um autor, claro. Daquele que com a sua aldeia consegue descrever o mundo, um retrato da sua época e atemporal ao mesmo tempo. Se não pudesse ser um grande autor, pelo menos alguém que passa a sua vida cercado de muitos deles, pelo que produziram. Um professor universitário. Um pesquisador. Ou quem sabe um advogado, profissão que também se cerca de livros, linguagem, códigos. Se for para dar as costas para tudo isso, em viagens por lugares exóticos, com línguas que jamais soariam familiares, ser transportado num olhar a outra realidade. Projetar realidades, construções, arquiteturas, influenciar a pessoa sem que ela sinta, com a mágica da combinação de cores e móveis. Desenhar o trivial e transformar em algo novo e surpreendente, um novo jeito de se sentar ou de se vestir. Salvar vidas, o que pode ser tanto num sentido biológico como simbólico, salvar a alma da ignorância ou dos seus próprios medos. Sendo nos sonhos as profissões tão grandes e tão nobres, eu não entendia quando via a entrevistas de palhaços – Arrelia quando eu era criança e o Tiririca quando eu já era maior – que diziam que escolheram ser palhaços porque não conseguiam imaginar algo mais bacana do que viver de fazer as pessoas rirem.

cidades

Sobre a tirinha: Macanudo é uma expressão argentina antiga, algo como “supimpa”. O autor, Liniers, batizou com esse nome apenas para colocar Supimpa no meio do jornal.

Risos e lágrimas

Eu conheci uma mulher que quando sentia dor, ria de nervoso. O que era muito problemático, por mais que antecipadamente ela dissesse pras pessoas que isso acontecia. Ela tinha um problema grave de coluna, e no dia em que foi pra faca, as costas dela travaram quando ela estava agachada. Ela começou a rir muito, a chorar de rir, e dizia que não conseguia se levantar. É claro que demorou muito pra levarem a sério e chamarem a ambulância.

Às vezes eu me sinto um pouco como essa mulher. Na minha ânsia de funcionar normalmente, quando estou deprimida continuo falando com as pessoas, continuo contando piadas – e algumas vezes sou até mais engraçada do que o usual, numa tentativa de ficar feliz vendo as pessoas à minha volta felizes. Assim como a tal mulher, eu já tentei avisar pra várias pessoas que funciono assim quando estou mal e não adiantou nada. Eu digo que estou mal e não me levam à sério. E pior: acham que fazendo piada eu volto ao normal. Me vêem como uma boba alegre que não tem direito a dias ruins.

Àqueles amigos que percebem que quando eu chego ao ponto de dizer “não estou bem”, é porque a coisa está muito séria, deixo aqui meu agradecimento e amizade eternos.