Duas curtas sobre costura

Teve vezes que eu tive vontade de chorar na frente da máquina. Um servicinho fácil, que numa reta levaria uns dois minutos, levando pelo menos dez. Era costurar um pouco na agulha dupla e as linhas embolavam, pulavam pontos, arrebentavam. Aí eu tinha que parar, passar o fio de novo, voltar mais um pouco. Dá mais trabalho e o acabamento fica ruim. Quis chorar de raiva e de impotência. Pensei em comprar uma galoneira de uma vez. Aí fui percebendo que acontece só na linha de fora, e só com os tecidos muito macios. Ou seja, eu teria que usar uma agulha mais fina. Na prática não dá, porque ela quebraria nos pedaços que as costuras se encontram. Agora continuam acontecendo as mesmas coisas – a linha arrebentando, embolando, pulando pontos – mas eu estou tranquila. Não mudou nada, a dificuldade continua a mesma. Ser humano é um bicho que precisa entender.

.oOo.

Eu estava costurando e me veio o medo. E se eu fracassar? E se tudo isso que eu comprei, o CNPJ, o site, enfim, se tudo acabar não dando em nada? Ah, meu outro lado pensou, taí uma coisa impossível de acontecer, eu fracassar costurando. Leela, leela! Esse conceito diz que a vida nada mais é do que um jogo, uma festa do espírito, que ele se envolve e logo abandona. Não existe ganhar ou perder, existe apenas o jogo. Aprendi uma habilidade que me deixa tão feliz, tão independente. Conheci um mundo novo, pessoas novas, uma nova forma de alegria. Mesmo que ninguém comprasse mais, ou que eu nunca mais precise vender, continuarei costurando pra mim. Vida é leela, costurar é leela, vida é costura.